Você vai conhecer agora três
candidatos que alcançaram nota máxima na prova do Enem. Fizemos a eles as
perguntas mais decisivas: como se prepararam? quais são as suas dicas? O que
fazer para superar a ansiedade da página em branco, na hora e escrever?
Carlos Eduardo Lopes
Marciano, autor da redação nota mil "O verdadeiro preço de um brinquedo", que você leu
algumas páginas atrás. Ele passou para o curso de Engenharia.
Isabela Cruz. A
redação que ela apresentou foi utilizada no Guia do Candidato do Enem, para
indicar o que é um texto nota mil. Agora a estudante de Medicina desvenda como
chegou a isso e como você pode fazer o mesmo.
João Pedro Maciel Schlaepfer,
autor da redação nota mil "Quem
Sabe o que É Melhor para Ela ?". Ele entrou no curso de Letras.
Eles abrem o jogo e,
com muita generosidade, dão o caminho das pedras para quem está se preparando
para enfrentar o mesmo desafio. Várias destas dicas podem ser aplicadas no seu
dia a dia. Faça isso: a nota mil que eles alcançaram é a prova de que seus
métodos funcionam.
1. A melhor
estratégia é a
prática
ISABELA CRUZ: A
melhor estratégia para superar o nervosismo na hora da prova é,
defi-nitivamente, a prática. Quando você sabe que deu o seu melhor, se esforçou
bastante e treinou vários temas diferentes, começar a escrever deixa de ser
difícil.
Fiz
o Enem exatamente na época em que a maioria das faculdades aderiu a ele e os
vestibulares, como o da UFRJ, acabaram. Assim que fiquei sabendo da importância
da prova para minha aprovação, passei a focar grande partir dos meus estudos em
como elaborar uma boa redação.
Na
minha própria escola, eu tinha aulas específicas de redação, mas, fora isso, eu
con-versei bastante com a minha professora e ela me ajudou muito. Assim, fazia,
pelo menos, uma redação por semana e ela a corrigia, fazendo com que eu
conseguisse ir moldando o meu texto ao que seria exigido pelos corretores, o
que me ajudou bastante.
Além
disso, como eu escrevia muitas redações, consegui abordar uma grande
diversidade de temas, incluindo várias propostas de provas antigas. Por sorte,
o tema escolhido para a minha prova era bastante parecido com um que eu já
tinha feito, o que me deixou muito mais tranquila no momento da prova.
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: Durante os anos de colégio, treinei diversos temas de
redação em sala. É necessário estar preparado para qualquer tema possível,
desde o mais elementar até o mai
desconhecido.
Mesmo
que seja um assunto sobre o qual ninguém de sua sala ouviu falar, eu garanto
ser completamente possível dissertar sobre ele de forma inteligente e
esclarecedora. Isso só é possível através do treino: escolher um tema aleatório
e tentar criar uma redação argumen-tativa é uma boa ideia para exercitar a
técnica.
Lembro-me
de ter pego o assunto "lixo urbano" ao acaso, um tema que não é muito
difícil, e tentado escrever um texto. No início, achei que não ficaria tão bom,
mas, quando termi-nei, fiquei bastante satisfeito. Depois, fui procurar na
internet outros argumentos, pontos de vista e citações que eu poderia ter
usado, a fim de aperfeiçoar esse mesmo tema caso, no futuro, eu tenha que
dissertar sobre o assunto novamente.
JOÃO PEDRO MACIEL
SCHLAEPFER: Minha preparação foi conturbada. Concluí o
terceiro ano do ensino médio em 2012. Saí do colégio diretamente para uma
universidade pública, em que cursava Geografia. Trabalhei no mesmo período
naquele colégio como monitor. O exercício da escrita nunca esteve ausente,
embora eu tenha ficado, depois desse vestibular, dois anos sem praticar a
redação dissertativo-argumentativa.
Enquanto
estive na escola, cumpri meus deveres, o professor não dá aquelas dicas à toa.
A nota, porém, só veio dois anos mais tarde, quando eu já tinha desistido da primeira
graduação e não estava mais em curso pré-vestibular. Pautei-me mais nos
critérios de correção do que na escrita propriamente dita.
2. O valor do conteúdo
CARLOSEDUARDOLOPES MARCIANO:
Sempre procuro colocar pelo menos uma refe-rência histórica. Outra técnica útil
é citar uma autoridade no assunto. Apesar de eu não ter feito isso nesse texto
em específico, é algo que rende muitos pontos.
Apesar
de sempre ter gostado de escrever e, principalmente, conseguir ser compreendido quando escrevo, existem
várias alternativas de preparo para a criação de um bom texto.
Por
exemplo: no currículo do ensino médio, existem matérias de humanas como
história, geografia, filosofia e sociologia. Apesar de a prova do Enem ter
questões relativas a essas disciplinas, é necessário perceber que todas elas
também são de grande serventia na hora da redação. Citar um evento histórico
como argumento ou parafrasear um pensador relacionado à sua tese pode ser a
chave para um bom desempenho.
Por
isso, é preciso destacar a enorme importância dessas matérias na hora de
elaborar um texto e, consequentemente, dedicar uma atenção especial a essas
aulas.
Cheguei
a criar um documento com várias citações que poderiam ser úteis na hora de
criar um texto. À medida que lia algo que achava que podia ser útil, eu
adicionava à lista. No dia anterior à prova de redação, reli essas anotações na
tentativa de lembrar de usá-las.
3. Bagagem de
leitura e experiências aparece na prova
JOÃO PEDRO MACIEL
SCHLAEPFER: "Dica" é um tanto complicado. Além
do básico de praticar a escrita, acredito que o aluno a caminho da prova deve
admirar a paisagem. É óbvio que a questão de estudar, para a redação, português
e técnica de dissertação-argumentativa é fundamental, mas a parte que compete à
redação não trata apenas de conteúdo gramatical.
Fiz
a brincadeira ao mencionar a paisagem, pois o tema da prova pode coincidir de
ser discutido previamente em aula, independentemente desse debate anterior.
Para mim, é uma forma de exercício de lógica. Qual a dica então? Talvez, ser
curioso. Cada um da sua forma e no seu campo de interesse.
Essa
bagagem herdada de qualquer experiência vai servir para alguma função, apareça
ou não diretamente no texto. Pode ser que saia numa forma de raciocínio, num
caminho de argumentação menos comum, num sistema de analogias ...
ISABELA CRUZ: Ler
bastante, seja jornais, revistas, sites ou livros, é uma ótima estratégia para
uma boa redação. Com isso, seus textos ficarão mais bem escritos e você pode
evitar erros de ortografia, que são bastante mal vistos pela banca.
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: É necessário lembrar que absolutamente nenhum tema é
impossível. Mesmo que você se depare com um assunto jamais visto antes,
acredite: será completamente possível dissertar sobre ele através da bagagem
adquirida durante o ensino médio.
Um
exemplo é o Enem 2012, cujo tema de redação foi "A imigração para o Brasil
no sécu-lo XXI". Apesar de não ser um assunto muito comentado na maioria
dos colégios, é perfei-tamente possível utilizar aquilo que foi aprendido em
aulas de geografia ou história para a criação de um texto coerente e com bons
argumentos.
Tente
se lembrar de absolutamente tudo que você viu em aulas de história, geografia,
fi-losofia e sociologia. Todo argumento pode ser válido, desde que seja escrito
de forma co-erente.
Por
exemplo, em minha redação, consegui relacionar o surgimento da imprensa à
publici-dade infantil e, ao mesmo tempo, enriquecer o meu texto. À primeira
vista, podem parecer assuntos muito distintos, mas, acompanhados de uma
argumentação bem estruturada, clara e coerente, conseguem ser facilmente
relacionados.
4. Treinar o
tempo de escrita
ISABELA CRUZ: Um
ponto importante é treinar o tempo de escrita. Na minha prova, reservei uma
hora para o texto, nem um segundo a mais. Escrever o rascunho e a redação nesse
tempo foi um trabalho árduo, nas minhas aulas eu cheguei a ter que fazer uma
redação em vinte minutos só para poder praticar. E deu certo, usei o tempo todo
reservado sem precisar me estender muito
e perder minutos preciosos durante a prova.
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: É crucial aproveitar praticamente todo o tempo do exame.
Sair cedo geralmente indica que algo deu errado. Faça a prova com calma, se
preocupando apenas se você não está excedendo o tempo de cada questão. Eu, por
e-xemplo, fui dos últimos a sair no dia em que escrevi a redação nota mil e
tive que assinar a pauta de sala. correr
Lembro que, por ter demorado 1h30 na redação, tive que correr um pouco durante
a prova. É normal, imprevistos acontecem..
5. Como organizar
o texto
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: Sempre divido o texto em quatro partes: uma introdução
que termine em pergunta retórica; um parágrafo com um argumento; outro
pará-grafo com outro argumento; e uma conclusão, que, no caso do Enem, precisa
de propostas de intervenção.
Para
as propostas, sempre uso pelo menos duas, sendo que ambas devem ser bem
explicadas e desenvolvidas.
ISABELA CRUZ:
Saber a estrutura dos tipos de textos que podem cair em uma prova de vestibular
é fundamental, ou seja, saber exatamente como estruturar o seu texto. É
funda-mental pensar sempre na proposta de resolução, pois ela conta pontos
muito importantes na hora da correção.
6. Usando a linguagem a
seu favor
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: Usar muitos adjetivos é uma boa técnica para enriquecer
uma proposta, como eu fiz no meu texto. Uma dupla de adjetivos (como
"abu-sivas e inadequadas" ou "compreensível e responsável",
vistas no meu último parágrafo) são artifícios que sempre uso nas minhas
redações.
Uma
dica é o uso inteligente da vírgula: marcar as pausas no texto é algo essencial
para que o corretor compreenda o que você quer dizer. Ler o texto na sua mente
para ver se suas pausas estão bem colocadas é algo necessário na hora de
escrever uma redação.
ISABELA CRUZ:
Para conseguir construir um texto bem elaborado há que praticar o má-ximo
possível e prestar atenção ao que os avaliadores podem exigir d você na hora da
cor- reção. Por exemplo, fazer um bom uso de conectivos para ligar os
parágrafos da redação entre si é fundamental para a coesão do texto. Os
avaliadores tendem a valorizar um texto fluido e bem estruturado.
7. Superação do
nervosismo começa antes da prova
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: A superação do nervosismo começa antes da prova. É
importante chegar uma hora antes do início para garantir um bom lugar, se
acostumar com a sala, respirar e se acalmar um pouco.
ISABELA CRUZ:
Deixar o nervosismo de lado na hora da prova é indispensável, não só na
redação, mas também nas provas de múltipla escolha. Tirar o dia anterior ao
exame para relaxar ou fazer algum programa leve funcionou muito bem para mim.
Tudo o que você deveria estudar já foi estudado ao longo do ano inteiro,
resolver revisar a matéria inteira nas horas antes da prova só causa mais
estresse e ansiedade em relação à prova, então evite.
8. Métodos
que funcionam na hora da prova
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: Vou detalhar como escrevo uma redação. Durante os
primeiros 15-20 minutos, fico simplesmente olhando para a folha de papel em
branco e tentando formular uma tese, que deve ser defendida até o final. Para
isso, come-ço a escrever na parte de cima da folha os possíveis argumentos a
serem utilizados, sem-pre procurando no mínimo uma referência histórica. O
modelo de parágrafos que sigo é Introdução - > Argumento 1 - > Argumento
2 - > Conclusão. Após aproximadamente meia hora, já consigo ter o texto mais
ou menos montado na minha cabeça, e, seguindo as ano-tações que fiz na folha de
rascunho, começo a criar uma redação. Ao fim, releio, faço di-versas alterações
e transcrevo o texto para a folha oficial.
9. Vencer a ansiedade
diante da página em branco
JOÃO PEDRO MACIEL SCHLAEPFER: De
todas, essa é a parte mais difícil. Cansei de ver, como monitor, excelentes
alunos, com redações quase impecáveis, que voltavam das provas contando más
experiências. Simulado ajuda muito na preparação, mas, não importa quantos
sejam feitos, nada é igual à prova de verdade, sobretudo com a pressão e com
uma barreira: redigir.
É
difícil ver que a única pessoa que pode preencher aquela folha é você. Como foi
para mim? Demorado. Aquele não foi meu primeiro vestibular, foi o quinto, além
do Enem, tentava mais alternativas.
CARLOS EDUARDO LOPES
MARCIANO: Bloqueios criativos são normais. É comum não
conseguirmos achar um bom argumento para o tema em questão. Porém, a minha
única dica nesses casos é não desistir.
Acredite:
mais cedo ou mais tarde você pensará numa argumentação que irá garantir uma
ótima nota. Esqueça o tempo por um momento e apenas pense.
ISABELA CRUZ: Se
na hora der um branco, comece com qualquer coisa, nem que seja uma ideia ruim
que pode nem entrar na sua redação final. Só o fato de colocar a cabeça para
funcionar e começar a escrever algo já funciona para diminuir a ansiedade.
Para
ajudar um pouco, fazer uma espécie de brainstorming e colocar todas as suas
ideias ligadas àquele tema no papel facilita bastante. Eu, particularmente,
comecei a prova olhando o tema, escrevendo as principais ideias sobre ele, e
passei para a prova.
No
final, com as questões já resolvidas, voltei para a redação, e, como minhas
ideias já estavam no papel e tive um certo tempo para amadurecê-las no decorrer
da prova, come-cei a escrever o texto com tranquilidade e ainda sobrou um certo
tempinho no final.
10. Cada pessoa tem seu ponto de equilíbrio
JOÃO PEDRO MACIEL
SCHLAEPFER:
Cada pessoa tem sua excentricidade, e, geral-mente a partir dela, descobre seu
ponto de equilíbrio para poder acalmar-se e diminuir o peso que é colocado
sobre cada um (e costumamos aceitar) ao longo do ano.
Descobri
a respiração, o relaxamento. Parece contraproducente, mas repetidas vezes no
decorrer da prova parava, olhava para os lados, bocejava, pensava em coisas
comple-tamente aleatórias, dava um jeito de transporta minha cabeça para outro
lugar e só re-tornava uns minutos depois.
Reparei
que havia muito desespero, uma luta contra o relógio, que também pesa ao ver a
folha em branco. É preciso pensar, problematizar um certo tema, tomar uma
posição e organizar as ideias, contextualizá-las, desenvolvê-las, fazer uma
proposta de solução e concluí-las em cinco horas. Não, uma só, tecnicamente as
outras quatro são para o res-tante da prova. Paro, e respiro.
(Andrea
Ramal – Redação Excelente para Enem e Vestibulares – ED. Método, 2016)