Coletânea de textos
Os textos foram tirados de fontes diversas e
apresentam fatos, opiniões e argumentos relacionados com o tema. Eles não
representam a opinião da banca examinadora: são textos como aqueles aos quais
você está exposto na sua vida diária de leitor de jornais revistas ou livros, e
que você deve ler e comentar.
Consulte a coletânea e utilize-a segundo as
instruções específicas dadas para o tema. Não a copie.
Ao elaborar sua redação, você poderá
utilizar-se também de outras informações que julgar
relevantes para o desenvolvimento do tema.
ATENÇÃO: Se você não seguir
as instruções relativas ao tema que escolheu, sua reda-
ção
será ANULADA.
A ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria
e pela Vida, conhecida também como Campanha contra a Fome, tem provocado
numerosas manifestações contraditórias: reavivando uma discussão antiga sobre a
validade da ajuda aos desfavorecidos.
Levando em conta a coletânea abaixo, que
contém fatos e opiniões diversas sobre aque- Ia campanha, redija uma
dissertação sobre o tema: "Dar o peixe ou ensinar a pescar?".
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1)
Já são quase 32 milhões de brasileiros
famintos, num país que desperdiça somente em alimentos o equivalente a US$
4 bilhões. Apenas 20% desse desperdício saciaria a fome de todos esses brasileiros
miseráveis.
("0 avesso da fome", Jornal
do Brasil, 12/9/1993.)
2)
A cada ano que passa, mil crianças mor-rem
por dia debaixo do céu brasileiro. Mor-rem
de doenças para as quais a medicina criou
uma infinidade de nomes, todos sinônimos
de um só mal: fome, subnutrição.
(Eric Nepomuceno, Caderno FOME, Jornal
do Brasil, 12/9/1993
3)
Há uma miséria maior do que morrer de fome no deserto: é não ter o que comer na
Terra de Canaã.
(ALMEIDA, José Américo de. A
Bagaceira.
4)
Querido Cony, (. .. ) venho te dar os parabéns pela crônica "Não é por
aí". Também e não quero bagunçar a campanha contra a fome (. .. ), mas já
era tempo de alguém dizer que, para acabar com a fome, precisa-se de reforma
agrária, justiça social, melhor distribuição de renda. A caridade é uma das
virtudes teologais, mas para acabar com: fome no Brasil não basta ...
(Jorge Amado, Painel cio Leitor,
Folha de S.Paulo, 24/6/199
5)
Betinho - ... há uma relação estreita entre conjuntura e estrutura. Se eu não
sou capaz
de
mudar alguma coisa aqui e agora, seguramente não serei capaz de mudar no futuro.
Toda vitória que eu consiga hoje, por menor que seja, está criando condições
para a reforma estrutural.
Folha
- O movimento tem um caráter filantrópico, assistencialista. A filantropia
sempre foi considerada inócua e muitas vezes associada à picaretagem.
Betinho
- Pilantropia (ri). Esse movimento está nos obrigando a diferenciar solidariedade
de assistencialismo e filantropia de pilantropia. Para mim, solidariedade é um
gesto ético, de alguém que quer acabar com uma situação, e não perpetuá-la. Já
o assistencialismo é exatamente o contrário.
(De uma entrevista de
Betinho ao jornal Folha de S.Paulo, 5/9/1993.)
6)
Mas eis que Chico Buarque, justificando sua participação no show do Memorial,
veio com um argumento curioso. Você pode dizer que distribuir alimentos não
resolve nada, lembrava ele, "mas não distribuir resolve alguma coisa?"
Já que nada vale nada, um pouco de caridade é melhor do que nenhuma.
(Marcelo Coelho,
Folha de S.Paulo, 8/9/1993.)
7)
Na piscina do Clube Harmonia ouvi uma senhora gordinha dizendo que a campanha contra
a fome era comandada pelo PT e que tinha por objetivo arrasar com o nosso país.
Outras senhoras gordinhas concordam, repetindo a velha história de que era
melhor ensinar a pescar do que dar o peixe ...
(Geraldo Anhaia Meio, Painel do
Leitor, Folha de S.Paulo, 9/9/1993.)
8)
Pessoas que moram nas ruas de São Paulo não têm uma ideia exata do que seja a Campanha
da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. Elas se dizem cansadas
de movimentos que distribuem alimentos, mas não conseguem resolver o pro- blema
da miséria. Essas pessoas - que seriam as principais beneficiadas pela campanha
-pedem a criação de mais empregos, pois querem conseguir uma moradia e poder
escolher a comida.
(Folha de S.Paulo,
21/9/1993.)
9)
Na esperança da revolução redentora, a palavra de ordem era ensinar a pescar.
Dar o peixe era o pecado assistencialista, que retardava o processo
revolucionário. (... ) Hoje sabe-se: o capitalismo não acaba com a miséria. O
socialismo também não. Não há mais sonho nem utopia. Resta apenas a concretude
tenebrosa da miséria. L .. ) não se está sugerindo que a sociedade assuma o
papel do Estado. Mas é importante compreender: é a sociedade que muda o Estado,
não o contrário. L .. ) (o cidadão) morrerá, como têm morrido mulheres, se
alguém não lhe der comida:
(Alcione Araújo,
Caderno FOME, Jornal do Brasil, 12/9/1993.)
10)
Eu nunca senti fome na vida, mas acho que deve ser muito triste.
(Adriana, 12 anos,
revista Veja, 15/9/1993.)
Comentário:
A proposta apresenta claramente o tema a ser
desenvolvido: "Dar o peixe ou ensinar a pescar?". Vale lembrar que
tema não é o mesmo que título. Este, portanto, deveria ter sido elaborado pelo
candidato, de modo a sintetizar as ideias contidas no texto.
O texto do jornal do Brasil aponta para a má
distribuição de renda e para o desperdício de alimentos, contribuindo para o
aumento da miséria no Brasil. Eric Nepomuceno lembra do grande número de
doenças causadas pela fome, que atingem as crianças de todo o país. José Américo
de Almeida dá tratamento literário ao tema, indiretamente transmitindo a ideia
de que há recursos, porém estes não são aproveitados e compartilhados por
todos.
Jorge Amado chama atenção para a necessidade
de transformações sociais, tais como a
reforma agrária e a melhor distribuição de renda. Apenas ajudar na Campanha
contra a Fome
não resolve, pois não ataca a raiz do problema, apenas as causas.
Betinho, em entrevista à Folha de S.Paulo,
defende a campanha como um passo para que mudanças maiores possam ocorrer no
futuro, na estrutura social. Chico Buarque endossa a campanha, defendendo a ideia
de que fazer alguma coisa é melhor que não fazer nada.
Geraldo Anhaia Meio critica de modo sutil e
irônico a atitude das "senhoras gordinhas" de
acharem
que essa campanha era partidária e prejudicava a imagem do país. Tal descompromisso
com a situação de tantos brasileiros vem ao encontro do depoimento de
Adriana
à revista Veja, revelando um certo distanciamento da realidade em questão.
Os trechos da Folha de S.Paulo, de 21/9/93,
e do jornal do Brasil, de 12/9/93, apresentam duas ideias opostas: a primeira
delas de que as pessoas beneficiadas querem tão-somente mudanças estruturais na
sociedade e condições de buscarem o que desejam; já a segunda mostra a
necessidade de uma atitude mais imediata, "de dar o peixe", a fim de
que "o cidadão não morra", e a longo prazo "ensinar-lhe a
pescar" ou dar-lhe condições para tanto.
O candidato poderia optar por um dos dois
caminhos sugeridos pela proposta ou por um ponto de equilíbrio, seguindo a
linha adotada por Alcione Araújo.