Redija
um texto dissertativo a respeito da violência, estabelecendo relações entre as
ideias expressas nos textos I e II.
Texto 1
A onda de violência que vivemos hoje
deve-se a incontáveis motivos. Um deles parece-me especialmente virulento: o
desinvestimento cultural na ideia do “próximo”.
Substituímos a prática de reflexão
ética pelo treinamento nos cálculos econômicos; brindamos alegremente o
“enterro” das utopias socialistas; reduzimos virtude e excelência pessoais a
sucesso midiático; transformamos nossas universidades em máquinas de produção
padronizada de diplomas e teses; multiplicamos nossos “pátios dos milagres”,
esgotos a céu aberto, analfabetos, delinquentes e, por fim, aderimos à lei do
mercado com a volúpia de quem aperta a corda do próprio pescoço, na pressa de
encurtar o inelutável fim.
Voltamos as costas ao mundo e
construímos barricadas em torno do idealizado valor de nossa intimidade.
Fizemos de nossas vidas claustros sem virtudes; encolhemos nossos sonhos para
que coubessem em nossas ínfimas singularidades interiores; vasculhamos nossos
corpos, sexos e sentimentos com a obsessão de quem vive um transe narcísico
e, enfim, aqui estamos nós, prisioneiros de cartões de crédito, carreiras de
cocaína e da dolorosa consciência de que nenhuma fantasia sexual ou romântica
pode saciar a voracidade com que desejamos ser felizes.
Sozinhos em nossa descrença,
suplicamos proteção a economistas, policiais, especuladores e investidores
estrangeiros, como se algum deles pudesse restituir a esperança no “próximo”
que a lógica da mercadoria devorou.
Jurandir Freire Costa.- Folha de S.Paulo, 22/9/1996
(com adaptações).
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Texto 2
Inesgotável, o repertório do tráfico para
roubar-nos a dignidade revive as granadas. Três delas ganharam a rua no curto
intervalo de cinco dias, atiradas com a naturalidade de estalinho junino. Não
explodiram por sorte, inabilidade ou velhice.
Mas detonaram em nossas barbas o deboche
repetido com a métrica cotidiana da violência: é guerra. Uma de suas raízes
alimenta-se da disseminação de armas de fogo entre os traficantes, ferida
aberta à sombra de varizes socioeconômicas, cuja cicatrização agoniza no mofo
de desencontros e desinteresses políticos.
Como o natimorto dueto entre os
governos estadual e federal para reaver armamento militar em favelas do Rio:
muita encenação, nenhuma palha movida.
Doutor em combate, não precisa sê-lo
para ver: urge desarmar o adversário.
(Um adversário aparelhado até os
dentes, cujo desplante avança como formiga no açúcar.) Caminho que exige a
orquestração entre força e inteligência, prevenção e ataque — regidos pela
convergência de esforços políticos, indispensável para se vencer uma guerra.
Editorial. Jornal do Brasil, 16/9/2004 (com
adaptações).
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